Nome de trabalhadora rural está na lista
de pessoas ameaçadas de morte por
pistoleiros no Pará. Atores e atrizes vão a
Brasília protestar contra a violência no
campo.
Maria Joelma da Costa é uma brasileira
que, através de seu drama, despertou a
solidariedade de estrelas como Wagner
Moura, Letícia Sabatella e Camila
Pitanga. Ela é uma trabalhadora rural
marcada para morrer.
O sonho era envelhecer juntos. “Foi meu
primeiro namorado, pai dos meus quatro
filhos”, conta a sindicalista Maria Joelma
da Costa.
Não houve tempo para isso. “Dezinho foi
assassinado em 21 de novembro de
2000. Ele deixou o exemplo de um
grande homem, de um pai que não
pensava só na sua família, só nos seus
filhos. Ele deixou exemplo para outros
filhos, para outros jovens”, lembra
Joelma.
José Dutra da Costa, o Dezinho, tinha 43
anos quando morreu. Era o presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Rondon do Pará. Ele denunciava a
grilagem de terras públicas e a retirada
ilegal de madeira.
“Dezinho já mexeu com os interesses do
município. Ele foi ameaçado durante mais
de oito anos. Um pistoleiro foi visto atrás
da nossa casa. E várias emboscadas
foram feitas para Dezinho”, conta Joelma.
A sindicalista lembra o dia preciso em
que a filha do casal foi buscar o pai para
a morte. “Eu mandei a minha filha caçula
chamar o pai porque tinha uma pessoa
necessitando de falar com ele
urgentemente”, lembra.
Enquanto o marido não vinha, Joelma
serviu café e ficou fazendo sala para o
assassino. “O cidadão estava ali do meu
lado. Eu nunca imaginei que fosse um
pistoleiro armado para matar meu
esposo”.
Em frente de casa, três tiros foram
disparados. O pistoleiro foi preso e
condenado há 29 anos, mas já fugiu da
prisão. O fazendeiro José Décio Barroso
Nunes foi acusado de ser o mandante,
ficou 13 dias preso, mas nunca foi
julgado. Em nota enviada ao Fantástico, o
fazendeiro nega a acusação.
“Geralmente, quando alguém chega a ser
preso, é o pistoleiro. Alguém mandou ele
matar. Mas quem manda matar não está
preso”, ressalta Joelma.
Quando Dezinho morreu, Joelma achou
que tinha o dever moral de continuar a
luta do marido. Primeiro, cobrando por
justiça. E depois assumindo ela própria a
presidência do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará.
Desde então, o nome dela nunca mais
saiu da lista dos marcados para morrer.
A lista dos jurados de morte pela
pistolagem é divulgada todo ano pela
Comissão Pastoral da Terra da Igreja
Católica. A última tem 125 nomes. São
camponeses, padres, ativistas políticos e
sindicalistas que receberam ameaças de
morte em 16 estados. De acordo com a
Pastoral, só este ano, dez pessoas já
foram assassinadas por causa de
conflitos fundiários no Brasil.
O documentário "Esse homem vai
morrer", do diretor Emílio Gallo, conta a
história de uma outra lista pública de
pessoas ameaçadas de morte na cidade
de Rio Maria, no sul do Pará.
“Eu também constava em uma lista que
tinha preço. Cada um, conforme o cargo
que exercia, tinha um preço pela cabeça”, conta um dos ameaçados.
No filme, o padre Ricardo Resende, que
teve de ir embora da cidade para não
morrer, volta a Rio Maria para rezar uma
missa. No sermão, ele fala sobre Joelma.
“O marido dela foi assassinado, e ela é
ameaçada de morte”, alerta.
“É muito triste ler seu nome na lista. Eu
não sou uma pessoa livre. Eu não tenho a
liberdade de dizer que quero ir em tal
lugar e posso ir”, diz Joelma.
Um policial à paisana armado escolta
Joelma aonde quer que ela vá, 24 horas
por dia: nas ruas da cidade, no
cemitério, em frente ao túmulo do
marido, nas reuniões do sindicato, em
casa. “Quem não tem medo da morte? Eu
tenho sim. Mas a minha luta é pela vida.
Eu tenho certeza de que quero viver”,
afirma.
A luta da sindicalista para continuar viva
comoveu um grupo de artistas. Eles
foram com ela a Brasília entregar ao
ministro da Justiça a lista dos marcados
para morrer. Em depoimento à cineasta
Júlia Barreto, atores e atrizes
protestaram contra a violência no campo.
“A gente sabe que a violência tem sua
razão na ganância, no lucro imediato e
fácil. Nós precisamos mudar essa
situação”, pede Letícia Sabatella.
“Não admitimos a exploração de um
homem pelo homem de forma covarde e
não admitimos, principalmente, esse
faroeste primitivo”, diz Wagner Moura.
“Que isso não dê continuidade, que a
gente possa parar essa tristeza, essa
crueldade, essa barbárie”, completa
Camila Pitanga.
Joelma hoje é coordenadora regional da
Federação dos Trabalhadores na
Agricultura. E apesar do risco não pensa,
nem por um segundo, em ir embora dO
Pará.
“Eu passei a compreender que a gente
precisa lutar por nossos direitos. Eu
sonho muito que se faça justiça no nosso
Brasil. Estou persistindo, estou na
batalha. Eu não posso perder a
esperança”, finaliza Joelma.
Acompanhe o Fantástico também no
POR
Rel-UITA
19 de dezembro de 2006
Campanha Internacional de Combate à Violência no Campo
Caso Dezinho
Maria Joel Dias, viúva de Dezinho, recebe prêmio Nacional de Direitos Humanos
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Maria Joel Dias da Costa, conhecida particularmente, por nós da Rel-UITA, como “Joelma”, recebeu o XI Prêmio de Direitos Humanos do Brasil na categoria “Defensores dos Direitos Humanos”. Neste ano o prêmio recebeu o nome de Dorothy Stang, em homenagem à missionária assassinada no ano passado na região de Anapu, estado do Pará.
Joelma é viúva de José Dutra da Costa, o “Dezinho”, assassinado em 2000 por uma quadrilha de “grileiros” e fazendeiros da região, quando era presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará. A história deste crime ainda impune foi relatada pela própria Joelma e suas filhas no vídeo produzido em 2005 pela Rel-UITA e pela Contag,* com o apoio dos sindicatos suecos de LO-TCO, no marco da campanha internacional: “Chega de violência no campo. Corte este mal pela raiz”.
Joelma é atualmente presidenta do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, está ameaçada de morte, mas continua levando adiante a tarefa que era de seu companheiro Dezinho, tragicamente interrompida.
Este prêmio, outorgado pelo governo brasileiro do Presidente Lula, põe uma vez mais sobre a mesa o duríssimo conflito interno existente no Brasil envolvendo a distribuição da terra e os direitos trabalhistas e civis dos trabalhadores rurais e pequenos camponeses.
A Rel-UITA felicita o governo brasileiro pelo reconhecimento a esta lutadora de primeira linha, e sobretudo abraça calorosa e fraternalmente a Joelma e, através desse abraço, a todas e a todos aqueles que, colocando em risco as suas próprias vidas, e muitas vezes as de seus familiares, lutam no Brasil e na América Latina pelo direito à terra, aos seus frutos e por uma convivência sem medo, com justiça e dignidade.